Carta para as amigas
Mesmo que tudo ao redor se apague, ainda enxergamos um horizonte juntas até que enfim desapareça, e continuamos a criar nossas histórias.
Apesar de ser fã dos clichês, desejo contar tudo sempre de um jeito verdadeiro, mas diferente. Às vezes dá certo e então continuo ganhando a vida com isso.
Todas as formas de nos reinventarmos tentamos, querendo fazer com que coisas bonitas se repitam sempre, como nossos encontros. Até as inevitáveis e incômodas podemos sustentar, como as confissões e reclamações repetidas. Nossa certeza de acolhimento apesar dos medos. Nossas ligações inesperadas mas sempre respondidas, mesmo que tempos depois.
Cansamos mas não o suficiente pra descansar. Nos cobramos dar atenção, ganhar a vida, ganhar a grana, ganhar os jogos, ganhar motivos pra acordar, pra dormir, pra ser. Renegando muitas vezes tudo que temos de bom. Reconhecemos sermos incríveis, mas sempre a dúvida entremeada.
Queremos ter filhos e temos, não queremos e não temos, nos achamos doidas e temos raiva de quem nos acha porque doida é a puta que o pariu. Tentamos fazer certinho, pensamos certo e agimos torto. E vice-versa. Ficamos à mercê do mar, boiando e achando que o mundo é grande demais e somos tão pequenas. Ficamos enormes de posse do nosso prazer e do nosso corpo, da nossa inteligência. E vamos, e falamos tanto, na mesma medida que silenciamos com culpa.
Lembramos de tudo que nos fez bem, do que fez mal, lembramos que não controlamos nada. Vemos uma cena bonita e ouvimos palavras de afeto que mudam tudo, e esquecemos tudo, pra só lembrar que podia ser sempre bonito mas não é. Mas como também é, pode ser que valha a pena.
A pena, os pesares que se não valerem não tem vida, não tem conversa, não tem por que.
Ficamos. Seguimos. Estamos. Ser mulher no mundo é muito diferente e a gente sabe. Então sonhamos, e foda-se. Mesmo que tudo mais se apague, ainda enxergamos um horizonte juntas até que desapareça, e continuamos a criar nossas histórias.
Ainda há tempo. Não sei. Por agora sim.
(Tava tocando música até agora e então parou. E o silêncio é lindo demais. Ouçam esses ruídos do silêncio, esse mundo acontecendo baixinho).